segunda-feira, 30 de novembro de 2015

''O Amor e Outras Crueldades''

Há dias assim. Esconsos. Insonsos. Neutros. Acomodados. Dias que só fazem número. Nem deveriam estar aqui., a somar na nossa vida. Não contam para nada. Não nos põem mais cultos, nem mais sãos, nem mais felizes, nem mais emocionados. Não ficam nas nossas recordações. Apenas ficamos mais velhos. Na realidade nem o sentimos. São apenas folhas de calendário. São dias de não sair da cama, não sair de casa, não sair para a vida. Não porque estejamos tristes mas porque nada acontece e ficar na cama pode ser um óptimo programa. Há quem tenha muitos destes dias mas para quem desafia a vida a não os ter por perto, como eu, a sua existência magoa, irrita! É um desperdício de vida, tempo perdido! Estamos num tempo parado, à espera que aconteça. Queremos puxar o tempo do futuro para trás, como uma película de cinema. Ver os frames mais adiantes. E se forem como desejamos, vivê-los agora. São dias de expectativa, de ansiedade, de medo e tensão. São dias completamente desperdiçados. Não deveriam existir. Queimaria momentos da minha existência, anularia os efeitos, positivos ou negativos do que nestes dias fizer. Não pagaria as refeições, a portagem, o combustível. Não receberia chamadas, não responderia a mails. Não sorriria no corredor, nem beijaria o grupo de mulheres que comigo se cruzou. Não despertaria comentários de qualquer espécie nem os emitiria. (perigoso emitir comentários nestes dias de negação!) Não comeria, nem beberia. Não tomaria banhos nem faria a barba. Não faria a cama nem ligaria o computador. Não ouviria as notícias nem seria notícia. Não olharia para nenhuma mulher nem para as estatísticas de resultados. Não chatearia nem me chateariam. Não viveria estes dias, simplesmente! Dava-os, incinerava-os, licitava-os, leiloava-os, atirava-os pela janela, ao mar, ao vento. Lançava-os dentro de um Shuttle para o espaço! E deitava foguetes para celebrar! Mandava-os à Lua, a Marte, à merda! Mandava-os dar uma volta ao bilhar grande, pastar caracóis, ver se eu estou na esquina, ver se chove, dar de comer ao cavalo do D. José, comer o leão do Marquês, dar milho aos pardais, caçar gambuzinos, catar milho. Ir ver se eu nasci!!! Eu não quero estes dias, repudio-os, exilo-os, expulso-os, emigro-os, recambio-os, despacho-os em envelope selado, com lacre, selo de embaixada em mala diplomática, fechada a sete chaves, quatro cadeados e três metros de correntes. Atiro-os ao Niágara, aos crocodilos, ao Vesúvio! Faço-os desaparecer no Tejo com um bloco de cimento atado aos pés, meto-os no cofre do BPN, na declaração de impostos do Amorim! Eu quero me lixar para estes dias. Fiquem-me com eles , eu pago para isso, eu imploro, suplico, ajoelho-me, prostro-me! EU NÃO QUERO estes dias! São os dias que faltam para…, os dias até chegar… os dias do ainda, os dias do nunca mais, os dias das noites. São dias infernais, impostos, exigidos, taxados, cravados, implantados, encravados, pregados, atados, colados, fundidos, selados, amarrados, empalados! São dias que não queremos, não pedimos, não os deveríamos ter . Quando temos controlo sobre o que fazemos podemos valorizar estes dias, dar-lhe utilidade, memória. Mas quando dependemos de terceiro, estes dias poderiam ser entregues a outros que bem falta lhes fariam para viver. Eu estou disposto a fazer um banco de vida, doar dias, vender dois em um, oferecer três na compra de dois, saldar, brindar, fazer um time –sharing. EU venderia a minha alma ao diabo, ser um Fausto, um Dorian Gray e dar ao Demo este tempo. Faria tudo, daria tudo (sobretudo estes dias!) mas tudo, a troco de te ter já aqui!